Sem Modos

Eudes Mota & Aprígio Fonseca

Novembro a Dezembro de 2016

Das Sagradas Invasões Mundanas

Após muito andar, pode-se cair exausto de cansaço. Pode haver regozijo neste tipo de queda. Pode haver prazer, mesmo que mórbido, em sucumbir à exaustão, se deixar sepultar por si mesmo, no fundo de si mesmo. Estranho prazer esse de finalmente ceder, abandonar-se, naufragar em si mesmo e não mais oferecer qualquer resistência. Grega melancolia. Melagcholía: mélas, “negro”; cholé, “bílis”. A “Bílis Negra” de Hipócrates e de Aristóteles é um dos humores que compõem a alma. A melancolia gera uma clausura: passa-se a ser cárcere e carcereiro de si. Suspendendo todo fora, aquele que sucumbe sepultado em si, quer assegurar-se de que, assim, protegido do devir, fora do tempo, se manterá na eternidade da identidade, idem a si mesmo. A arte, após muito andar, pode cair exausta de cansaço. Ela pode servir de cárcere e carcereiro para si mesma. E pode ser um esforço inútil de supressão do devir e de apagamento do seu fora. Haveria de se pensar que na recusa de um fora de si, haveria uma mortífera e fatal vaidade. “O mundo não é digno de mim”, “o lado de fora nada me oferece”: diz a melancolia. Não estando o mundo À altura do melancólico, nada mais resta do que a sua anulação, o alijamento desse paupérrimo lado de fora. (...)

Curadoria de Marcelo Coutinho

Catálogo da exposição